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Testemunha de Jeová: Justiça condena Espanha por transfusão

Decisão ocorreu nesta terça-feira

Nesta terça-feira (17), o Tribunal Europeu de Direitos Humanos (TEDH) condenou a Espanha por conta de uma transfusão de sangue que foi realizada em um hospital de Madri em uma mulher equatoriana, que é testemunha de Jeová. Ela havia formalizado repetidamente seu desejo de não ser submetida a esse procedimento.

Em sua decisão, os juízes europeus apontam uma sucessão de falhas no processo de decisão que levou à realização da transfusão de sangue ocorrida no hospital La Paz, na capital espanhola, para onde tinha sido transferida com urgência a demandante, Rosa Edelmira Pindo Mulla, uma cidadã equatoriana residente em Soria.

O tribunal afirma que a juíza de plantão que tomou a decisão tinha informações “muito limitadas, errôneas e incompletas” e que não puderam ser corrigidas porque nem a própria Pindo nem nenhum dos seus familiares foram informados.

Na verdade, parte do problema residia no fato de os funcionários do hospital “não terem seguido o procedimento habitual para obter o consentimento”, ao tratar a situação como uma emergência, e terem dito a juìza de plantão que a paciente recusou “qualquer tipo de tratamento” e havia expressado sua rejeição apenas oralmente, quando isso não era verdade.

Os acontecimentos remontam a 6 de junho de 2018, quando Pindo deu entrada no hospital de Soria para uma operação, mas no dia seguinte, devido a uma hemorragia, foi transferida para o hospital La Paz, em Madri, onde foi submetida a uma intervenção durante a qual foi realizada uma transfusão sem que ela tivesse sido comunicada da decisão judicial porque, segundo os profissionais de saúde, seu estado não permitia.

A mulher, que se tornou testemunha de Jeová em 2001, levava sempre consigo um documento no qual recusava qualquer transfusão “mesmo que os profissionais de saúde considerassem necessário salvar sua vida” e, em agosto de 2017, formalizou perante a Junta de Castilla y León essa posição em suas diretrizes médicas antecipadas.

Com a decisão emitida hoje, o Tribunal Europeu de Direitos Humanos ordena que a Espanha pague à demandante 12 mil euros (R$ 73,6 mil) por danos imateriais e mais 14 mil euros (R$ 85,8 mil) por custos judiciais.

Na decisão, o TEDH reconhece que a juíza de plantão tomou a sua decisão guiada pelo princípio de que fosse feito tudo o que fosse possível para salvar a vida de Pindo.

No entanto, ressalta que “deixar a paciente decidir se aceita ou não um tratamento é um princípio elementar e fundamental” que “está protegido pela regra do livre consentimento”.

Nesse sentido, frisa que sua própria jurisprudência é clara ao afirmar que “um paciente adulto com discernimento é livre para decidir se aceita ou não uma intervenção cirúrgica ou um tratamento médico, incluindo uma transfusão de sangue”, e que sua autonomia deve ser conciliada com seu direito à vida em uma situação de emergência.

Em uma crítica clara à forma como as regras foram aplicadas neste caso, o Tribunal de Estrasburgo indica que “quando um Estado decide implementar um sistema de diretivas médicas antecipadas e os pacientes utilizam esse sistema, é importante que funcione de forma eficaz”.

O advogado de Pindo, Petr Muzny, disse que a sentença do TEDH é “uma excelente decisão” que “protege os direitos dos pacientes em toda a Europa” e “põe fim a certas exceções”, como a que sua cliente experimentou, na aplicação do livre consentimento.

Muzny salientou que o problema não estava nas regras existentes, que não têm de ser modificadas, mas que houve “uma aplicação distorcida da legislação”, e que sua cliente espera que a partir de agora, quando for ao hospital, “isso não volte a acontecer”

No mérito, o advogado declarou que a sentença “favorece os pacientes” porque garante a concretização da sua vontade, “mas também os médicos”, uma vez que os exime da “grave responsabilidade” na tomada de decisões em casos como o que afetou Pindo.