O jovem Yuri Gama Deça, de 20 anos, resolveu procurar ajuda médica após surgirem alguns sintomas “que não faziam sentido”. Durante os exames, que também revelaram uma Infecção Sexualmente Transmissível (IST), ele descobriu que estava esperando um bebê.
Yuri, que mora em São José (SC), é um homem trans. Ele deu início à sua transição aos 17 anos, quase três anos antes de engravidar da pequena, Sofia, nascida em janeiro. A filha foi resultado de um relacionamento breve entre Yuri, que é bissexual, e o genitor, que não participa da vida da criança. Com a gravidez não planejada, o catarinense se tornou pai solo.
“Eu estava me sentindo mal, fui no posto de saúde e descobri que estava com sífilis. Fiz o tratamento, mas perguntei pra médica de outros sintomas, como enjoo e pressão baixa, e ela me recomendou fazer um teste de gravidez.”
O jovem já tinha feito o mesmo teste alguns meses antes, quando passou por por uma suspeita de gravidez ectópica (gestação em que o óvulo fertilizado é implantado fora do útero). Na época, a suspeita acabou sendo descartada.
Ao tomar ciência da possível gravidez, Yuri prontamente ligou para o padrasto e pediu que ele comprasse um teste de farmácia, para que a família descobrisse o resultado em casa.
“Quando cheguei em casa já fiz e veio o positivo. Falei pra minha mãe, e ela não quis acreditar muito, falou pra eu fazer o de sangue. Estava ali: positivo.”
Ter filhos nunca esteve nos planos de Yuri, mas ele afirma ter lidado bem com a notícia da chegada de Sofia, apesar de ter “sofrido” com o crescimento da barriga ao longo da gestação – que causava dismorfia, a sensação de que algo estava errado com seu corpo.
“Não planejava ser pai ou montar uma família justamente por que eu ia ser muito julgado pelas pessoas e eu tinha um pouco de receio.”, contou.
Ao longo da gravidez, o jovem passou a maior parte do tempo dentro de casa, trabalhando, com o intuito de evitar o contato com outras pessoas.
“Eu não era muito respeitado e isso me deixava muito, muito mal. Mas assim que descobri que ia ser pai, fiquei muito feliz, assim como a minha mãe, o meu padrasto, toda minha família. em choque. Ficamos em choque também, porque sempre falaram que eu era o menos provável ali pra ter filhos, talvez por eu ser um garoto trans.”
A família de Yuri acabou se tornando sua rede de apoio na criação do bebê. Eles ajudaram Yuri a comprar todo o enxoval e o apoiaram quando ele resolveu voltar para a escola, quando a menina tinha apenas um mês de vida.
Os amigos, no entanto, desapareceram da vida de Yuri. “Dos 10 que eu tinha, sobrou um, que só veio me ver depois que tive a Sofia.”
“Eu tinha parado de estudar há um ano quando engravidei, mas decidi terminar para poder ter melhores oportunidades de trabalho e dar uma condição boa para ela. Voltei para o 3° ano do ensino médio.”
Yuri conta que, ao contrário de gestar, o parto acabou sendo uma experiência ótima. Em sua conta no TikTok, ele publicou um vídeo contando sua experiência no SUS, onde se sentiu “muito respeitado”.
“Foi maravilhoso, a criança saiu e já subiu uma alegria, tudo mudou, já foi uma coisa diferente.”
O rapaz conta que, com a chegada de Sofia, seu maior desafio é ter que deixar a menina com outras pessoas para seguir sua rotina na escola e no trabalho.
Ele desdobra para manter a filha e conta que exigiu o afastamento do genitor após ele não aceitar bem o fim do relacionamento dos dois, que durou cerca de quatro meses.
“A minha relação com ele não era muito boa, a gente sempre estava brigando, sempre tentando rebaixar um ao outro e ele, na verdade, nunca me viu como homem. Ele me chamava pelos pronomes certos, mas quando terminamos ele simplesmente parou de me respeitar e começou a falar pra todo mundo que eu era uma mulher.”, relata.
A situação levou Yuri a encarar a paternidade solo, uma questão tranquila para o jovem, que faz planos para o futuro ao lado da filha.
“Quero aproveitar porque eles crescem rápido e seguem o próprio rumo. Quero aproveitar cada momento ao lado da minha filha e não ser só um pai pra ela. Quero ser um amigo, que ela tenha a liberdade de se expressar e falar tudo o que sente.”
