Empreendedora adapta receita da família e fatura milhões vendendo pão de queijo
Rafaela Gontijo criou a NUU Alimentos para produzir o quitute para o consumidor moderno e mais consciente, que busca produtos menos industrializados
Fofinho e saboroso, o pão de queijo tem um dia só para ele: nesta quarta-feira (17/8), comemoramos a existência do quitute que está presente em cada esquina brasileira, das estufas dos botecos às festas de família. Perfeita para matar a fome em momentos de pressa ou para comer com calma acompanhada de um cafezinho, a tradicional iguaria mineira ganha ar de inovação com a foodtech NUU Alimentos.
A fundadora, Rafaela Gontijo, foi criada na fazenda onde os pais moram até hoje, no interior de Minas Gerais. Ali, cresceu comendo o pão de queijo simples, feito a partir da receita da família. Quando levava o quitute para os amigos do Rio de Janeiro, para onde se mudou a trabalho, surpreendia-se com o quanto eles ficavam encantados com aquela versão do prato.
As histórias sobre a origem do pão de queijo remontam ao século 18, na época do ciclo do ouro em Minas Gerais. Não existe uma única versão, mas elas creditam a criação da receita às mulheres negras escravizadas, que decidiram trocar a farinha de trigo trazida pelos portugueses, de má qualidade, pelo polvilho, criado a partir da mandioca, base da culinária indígena. “Foi passado de gerações em gerações em cadernos de receitas familiares até chegar na versão que comemos hoje. É uma receita brasileira, queremos valorizar o que é nosso, original, e honrar a receita que surgiu lá atrás. A modernização pode transformar tanto um produto que perdemos a sua origem”, pontua Gontijo.
A trajetória dela como empreendedora teve início em 2015, quando trabalhava como trainee na Johnson & Johnson e trilhava a carreira clássica em grandes corporações. Ela observou a tendência crescente do consumidor questionar mais o que comprava, preocupado em incluir na cesta produtos com valores semelhantes aos seus. Com o feedback positivo dos amigos, ela uniu forças com Erik Nako, chef e sócio, para colocar a mão na massa e criar a NUU. “Fomos para Minas e provamos mais de 200 pães de queijo diferentes, de Belo Horizonte até Patos de Minas, anotando todas as receitas”, recorda.
A produção começou na cozinha da casa de Gontijo e as primeiras vendas aconteceram em feiras. A partir do retorno dos clientes, foram modificando a receita até chegar à equação perfeita. “Temos muitas marcas que ultra-industrializaram o pão de queijo. A receita tradicional, com rescaldo, com queijo de leite cru, acabou esquecida. Eu senti que cabia uma marca nova que representasse o consumidor moderno e produzisse um produto nostálgico”, afirma.
Desde então, a NUU tem crescido a partir de bootstrapping, com investimento de R$ 2 milhões do capital dos sócios. A vontade deles era hackear o que a grande indústria faz, do ponto de vista logístico e operacional, e trazer uma transformação sistêmica, gerando impacto positivo, com o uso de tecnologia. Com 15 SKUs – o pão de queijo é o carro-chefe, é claro, mas o portfólio também conta com palitinhos de tapioca e pizzas com massa de pão de queijo –, a empresa estima faturar R$ 7 milhões em 2022. “Acreditamos muito nesses ingredientes. Escolhemos o que as nossas avós colocariam nas receitas. É um saber ancestral de ingredientes simples. Não usamos nada que venha de fora, apenas nativos de biomas locais”, ressalta.
A fábrica, em Patos de Minas, tem capacidade produtiva de 200 toneladas por mês. Os sócios investiram R$ 5 milhões na planta fabril, que conta com 210 placas fotovoltaicas para captar energia solar, uma caixa para captação de água das chuvas com armazenamento de 10 mil litros, além da prática de upcycling para reaproveitar os insumos.
Os produtos podem ser adquiridos pelo e-commerce da marca – onde as novidades chegam primeiro, como os pães de queijo coloridos, que ganharam cores a partir do uso de beterraba, cúrcuma e outros corantes naturais –; apps de varejo (Shopper, Rappi), grandes redes como Pão de Açúcar, Carrefour e Zona Sul; e food service, como cafeterias, padarias de mercados e nos cinemas da rede Kinoplex. O objetivo da NUU é chegar a 6 mil PDVs nos próximos dois anos.
A foodtech está na etapa final da sua primeira captação de recursos. A rodada de Série A deve trazer R$ 20 milhões para a empresa, que serão alocados em vendas, marketing e tecnologia para pesquisa e desenvolvimento de novos produtos. Em outubro, será lançado o primeiro item plant-based da NUU, com base de mandioca e fermentação natural de grãos, seguindo tendências de fora do país.
A empresa também estuda a internacionalização nos próximos anos, com desejo de desembarcar nos Estados Unidos inicialmente, onde cresce a abertura para o pão de queijo. “Por que a gente encontra croissant nas padarias do Brasil e não encontramos pão de queijo nas padarias francesas? Queremos levar para fora de fato, acreditamos que ainda vá crescer muito”, declara.