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Entenda por que o termo ‘crime passional’ não se aplica ao caso Vitória e não existe na legislação

Descubra os motivos pelos quais o termo ‘crime passional’ é inadequado para descrever o caso de Vitória e por que ele não é reconhecido oficialmente na legislação brasileira

O delegado Aldo Galiano, que lidera a investigação do assassinato de Vitória Regina de Sousa, 17 anos, mencionou que o crime poderia ser um “crime passional”. No entanto, essa classificação não é reconhecida pelo Código Penal e é frequentemente evitada pelos profissionais do direito.

O que se sabe até agora

Embora tenha sido sugerido que o crime foi cometido sob intensa emoção, as verdadeiras motivações ainda são desconhecidas. Vitória foi encontrada sem vida em uma área florestal em Cajamar, na Grande São Paulo, no dia 5.

Ela foi achada com a cabeça raspada e uma incisão no pescoço. A expressão “crime passional” não consta no Código Penal Brasileiro. Apesar de ser utilizada para descrever crimes que envolvem relações pessoais, especialistas alertam que essa terminologia pode levar a interpretações errôneas nos processos judiciais.

Geralmente, o chamado “crime passional” envolve ciúmes, traição ou decepção amorosa. Segundo o Direito Penal, casos que envolvem relações conjugais devem ser analisados individualmente, baseando-se nos fatos apresentados.

Quando o crime inclui violência doméstica ou ataque direto à condição feminina com resultado de morte, deve ser tratado e investigado como feminicídio. Se não resultar em morte, é mais adequado referir-se como “violência contra a mulher”, conforme explica Rodrigo Azevedo, especialista em Criminologia e professor de Ciências Criminais da PUC-RS.

“O termo violência contra a mulher esclarece que se trata de um crime misógino, motivado por machismo, tentativas de controle entre outros aspectos. Existem diversos tipos penais associados: stalking, violência psicológica, física e feminicídio. É preferível usar essa nomenclatura mais alinhada às mudanças sociais recentes,” afirma Rodrigo de Azevedo.

A terminologia pode ‘amenizar’ o crime

Segundo Vanessa Paiva, advogada especializada em violência doméstica em entrevista ao UOL, o uso do termo “crime passional” provém de uma visão antiquada do Código Civil onde a mulher era vista como propriedade do marido.

O crime passional implica que o homem foi provocado por ela para cometer tal ‘erro’. Isso remonta a um Código Civil antigo que tratava a mulher como propriedade do marido, como se ela fosse um objeto que o marido e ‘dono’ pudesse ‘danificar’ conforme desejasse, explica Vanessa Paiva.

O emprego da expressão “crime passional” pode facilitar a aplicação de atenuantes no julgamento, relativizando o ato violento. Azevedo menciona que a justificativa de um “forte sentimento” frequentemente é usada para reduzir penas. Essa terminologia também pode levar à culpabilização da vítima, sugerindo que ela possa ter alguma responsabilidade pelo ocorrido.

Tecnicamente, o “crime passional” deve ser classificado como homicídio, lesão corporal, feminicídio ou outra tipificação penal adequada.

Em caso de violência, denuncie

Se você testemunhar qualquer forma de agressão contra mulheres, não hesite em ligar para 190. A maioria dos casos de violência doméstica é perpetrada por parceiros ou ex-parceiros das vítimas. A Lei Maria da Penha também se aplica a agressões realizadas por familiares. Denúncias também podem ser feitas pelo número 180 — Central de Atendimento à Mulher — e pelo Disque 100, que trata de violações aos direitos humanos.