InternetJustiçaMundoPolítica

Nicarágua aprova emenda para monitorar trabalho da imprensa

Judiciário, controlado pelo regime Ortega, terá liberdade para definir o que é notícia falsa

O Parlamento da Nicarágua aprovou, nesta quinta-feira (16), artigos de uma emenda à Constituição que estabelece que o governo passe a monitorar a imprensa sob a alegação de evitar que se “dissemine notícias falsas”, o que muitos jornalistas consideram um ataque à liberdade.

A emenda constitucional, aprovada por unanimidade em uma segunda e última votação, também dá poderes ao Estado nicaraguense para garantir que a imprensa não esteja sujeita a interesses estrangeiros.

– O Estado deve garantir que a imprensa não esteja sujeita a interesses estrangeiros ou dissemine notícias falsas que ameacem os direitos do povo. A lei regulará essa matéria – afirma o artigo da Carta Magna.

A chamada Lei Especial sobre Crimes Cibernéticos, reformada pelo Parlamento em setembro do ano passado, que pune com prisão a disseminação de notícias falsas e/ou distorcidas que causem alarme, medo ou ansiedade entre a população, agora também se aplica a crimes cometidos dentro ou fora do território nacional por pessoas físicas ou jurídicas.

Essa lei, que gerou controvérsia na Nicarágua, onde a imprensa independente, agora em sua maioria no exílio, considera que ela ameaça a liberdade de imprensa, “criminaliza” o jornalismo investigativo e dá sinal verde para a espionagem de comunicações privadas.

A pena de prisão para cidadãos acusados de crimes cibernéticos contra a “segurança do Estado” aumentou de 10 para 15 anos. A definição de notícias falsas, porém, será discricionária. Críticos que apelidaram o projeto de “Lei da Mordaça” ou “Lei da Focinheira” alegam que ele não define dois conceitos-chave para sua aplicação: informações falsas e informações distorcidas.

Em outras palavras, o Judiciário, controlado por juízes e desembargadores alinhados com o governo do presidente Daniel Ortega, terão o poder discricionário de decidir o que é ou não uma informação falsa ou se a informação causa alarme, medo ou ansiedade, de acordo com a associação Jornalistas e Comunicadores Independentes da Nicarágua (PCIN).

A Fundação para a Liberdade de Expressão e Democracia (FLED), que faz parte da rede regional Voces del Sur, advertiu que a lei terá um impacto “devastador” sobre os jornalistas que trabalham dentro ou fora do país, e até mesmo sobre o público em geral.

A reforma constitucional também estabelece que os nicaraguenses terão direito a informações verdadeiras e que esse direito inclui a liberdade de buscar, receber e divulgar ideias e informações por qualquer meio, sem violar os princípios fundamentais estabelecidos na Constituição.

Outro artigo afirma: “O direito de informar é uma responsabilidade social e é exercido com estrito respeito aos princípios fundamentais estabelecidos na Constituição”.

Os legisladores, que reformarão 148 dos 198 artigos da Carta Magna e revogarão 37 outros, incluindo o que proíbe a prática da tortura e o recurso de habeas corpus, aprovaram nesta quinta-feira o Título IV sobre direitos, deveres e garantias do povo nicaraguense.

Além das regras de imprensa, a reforma amplia o mandato presidencial de cinco para seis anos; diz que o governo vai “coordenar” os outros “órgãos” do Estado, que não são mais chamados de poderes; legaliza a apatridia – termo que descreve pessoas sem nacionalidade reconhecida por qualquer país – e cria a Polícia Voluntária, que os críticos classificam como uma força paramilitar.

O presidente do Parlamento, Gustavo Cortés, afirmou que essa reforma parcial da Constituição será votada “artigo por artigo”, e espera-se que esteja concluída até o próximo dia 30.

Fonte: EFE