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Jovem que nasceu em decorrência de estupro conta sua história

Tasnim frisa que crimes do pai não a definem, e hoje se dedica a ser “a voz” que sua mãe não teve

“Querida Tas, você tem agora 10 dias de idade, mas quando você ler isso, pode estar muito mais velha. Eu te amo muito”. Foram essas as palavras que a jovem Tasnim Lowe leu no diário de sua mãe, Lucy, depois de descobrir a verdadeira história por trás de seu próprio nascimento: a de que sua genitora engravidou em decorrência de um estupro e que acabou morta aos 16 anos pelo seu abusador.

A revelação veio em um domingo de Dia das Mães, em 11 de março de 2018. Até então, Tasnim já tinha consciência de que seu pai havia tirado a vida de sua mãe, sua tia, Sarah, e sua avó, Linda Lowe, em um incêndio na casa da família em Shropshire, Inglaterra, em agosto de 2000.

Entretanto, um artigo no jornal Sunday Mirror publicado naquele Dia das Mães revelou outra informação aterradora: a de que o pai de Tasnim havia aliciado Lucy a fim de violentá-la sexualmente.

“A VOZ DE LUCY”

Lucy tinha 14 anos quando engravidou do seu abusador, o motorista de táxi Azhar Ali Mehmood, que era dez anos mais velho que ela. A adolescente registrou os acontecimentos em seu diário, documento que, dois anos depois, foi resgatado pela polícia nos destroços do incêndio que a vitimou.

O diário chegou às mãos de Tas após a publicação do Sunday Mirror em 2018. O artigo fez com que a jovem buscasse as autoridades para ver as evidências do caso de sua mãe, e encontrasse o diário esquecido no depósito da polícia.

Ao ler aquelas páginas, Tasnim teve a certeza de que a imprensa estava correta. Inicialmente, a revelação a deixou profundamente abalada.

– Você quer imaginar que seus pais estão felizes e apaixonados. Isso muda tudo o que você sabe e como você percebe as coisas sobre sua família e sobre si mesma. Porque sou filha de um assassino e também de um estuprador – desabafou em um documentário gravado para a BBC.

Posteriormente, no entanto, a descoberta despertou nela um sentimento de fazer algo a respeito para honrar a memória de sua mãe. Atualmente, a jovem se envolve com iniciativas para conscientizar sobre a exploração infantil e dedica-se a ser a “voz que Lucy nunca teve”.

– Acho que se eu pudesse falar com minha mãe, gostaria que ela soubesse como ela foi corajosa – conta Tas.

“NÃO É MINHA CULPA”

No relato à BBC, a jovem descreveu ainda o estigma que sofreu devido aos crimes de seu pai. Ela explica, porém, que ao ler o diário da sua mãe, concluiu que Lucy não gostaria que ela se sentisse mal consigo mesma e que deixasse os atos de Mehmood defini-la.

– Existe muito estigma, mas não deveria haver comigo. Não é sobre com quem você está relacionado, eu sou minha própria pessoa. E não é minha culpa. Eu apenas fui afetada por isso. Nasci de um estupro, mas isso não me define – ressaltou.

Mehmood foi condenado à prisão perpétua pelo triplo assassinato, um ano após atear fogo na casa da família. Ele mesmo salvou Tasnim do incêndio retirando-a da residência e colocando-a enrolada em um cobertor sob a macieira do jardim. Na época, ela tinha 16 meses de idade. Desde então, foi criada pelo avô, George.

VISITA NA PRISÃO

Tas chegou a visitar Mehmood na cadeia após completar 16 anos, tendo sido a primeira vez que o viu pessoalmente desde que era bebê. O objetivo, segundo ela, era formar suas “opiniões sobre ele como uma pessoa, não apenas pelo que havia ocorrido”.

– O que sinto sobre ele é confuso. Não é uma questão de preto no branco. As respostas que ele me deu… Foi como se nunca estivessem completas, quase como se eu devesse registrar tudo o que ele dizia para ouvir várias vezes depois, para ler nas entrelinhas – relatou.

Na ocasião, Mehmood a abraçou e comprou um bolo de chocolate a fim de “comemorar” o reencontro. Tas relata ter visto em seus atos e palavras os traços de manipulação que controlaram sua mãe. Desde então, ela nunca mais voltou a visitá-lo.

Apesar de toda a dor envolvida nessa triste história, um desdobramento traz gratidão ao coração da jovem: poder se sentir hoje mais próxima da mãe.

– Fico realmente agradecida porque pude encontrar alguns pertences de Lucy. Tenho seus diários. Quando ela estava escrevendo, ninguém podia vê-los. Isso me fez sentir mais próxima dela enquanto pessoa – completou Tasnim.